viver

Um texto difícil sobre compulsões, ídolos e ideias que te impedem de viver melhor

Mate seus ídolos. Antes que seja tarde. Encontre o endereço das suas compulsões mais comuns, das suas ideias mais radicais e mande um bombardeio por lá. Elimine todas as suas manias, vícios e obsessões.

Antes de falarmos um pouco de como isso está te matando, quero propor um pequeno exercício. Abra um bloco de notas. Pronto? É serio. Foi? Agora, dê o nome exato a sua estátua de idolatria preferida.

Tá difícil? Então vou te ajudar. Lembre-se que pode ser muitas coisas. Existem os ídolos que são um comportamento recorrente, uma ideia fixada na cabeça, uma pessoa que não se desfaz, um trabalho que te faz refém ou um sentimento que insiste em alugar um quarto na sua mente. Ou todos juntos.

Não tem como encomendar um torpedo preciso sem ter as coordenadas

Pode não ser hoje, nem amanhã, mas um dia, você vai atingir a maturidade e ter o discernimento do equilíbrio, mas para isso, vai precisar entender que domesticar paixões desnecessárias — seja ela qual for — vai acabar desgastando sua vida. Toda sensatez custa a ponderação.

A única desculpa para idolatrar algo de maneira fiel é mais pura imaturidade. É difícil desistir de algo quando você não está convencido de que aquilo precisa ser abandonado.

Passamos tanto tempo dedicados as nossas pequenas idolatrias de convicções, as monomanias de comportamento, as carências afetivas de pessoas e aos vislumbres sobre as nossas ideias que acabamos nos ferindo e anulando pessoas por causa delas.

Mas, calma lá. Eu não me refiro aos valores pessoais, as opções de desejos, as inclinações naturais, interesses específicos ou a afinação de gostos que vamos conquistando com o tempo.

Eu, por exemplo, acho que nunca vou enjoar de ouvir Chet Baker no começo do dia e Mac Miller nos fins de tarde, nunca deixaria de comer uma Pizza Hut ou até mesmo me desfazer de amizades com gente que amo e convivo há anos.

Não estou falando sobre aquela lista de preferências que está no nosso repertório de palpites, no elenco de pessoas que temos afinidades, nas concepções de convivência, no catálogo de conhecimentos prediletos, no inventário de argumentos ou no cardápio gourmet de sabores que criamos com o tempo, se descobrindo, afunilando e conhecendo-se.

O que acho extremamente perigoso é preservar ídolos em nome de uma adoração venerável que se assemelha a como pais ingênuos tratam tudo que o filho faz como se fosse ele fosse intocável. Me refiro a amores ensandecidos e obsessivos que se assemelham a uma espécie de fanatismo irreversível.

Como identificar essas dificuldades?

Bom, se você não consegue escanear as suas atitudes que o prejudicam, quero te ajudar a pensar um pouco sobre isso. Responda sinceramente essas perguntas abaixo e comece a pensar sobre isso.

  1. O que você acha que precisa para ser feliz?

  2. O que você pensa no meio da noite ou quando você acorda pela primeira vez pela manhã?

  3. No que você gasta muito tempo a cada dia?

  4. Com o que você se preocupa na maior parte do tempo?

  5. Do que você teria dificuldade em desistir por um mês?

  6. O que o deixa estressado ou deprimido?

  7. O que você faz quando está estressado e ou deprimido?

  8. O que você faz para evitar fazer coisas que não quer?

  9. Em que áreas de sua vida você enfrenta suas maiores lutas?

  10. De onde vêm seus sentimentos de autoestima?

  11. Para onde você foge quando está passando por momentos difíceis na vida?

  12. O que as pessoas dizem que você gasta muito tempo?

  13. O que você esconde dos outros?

  14. Sobre o que você fala demais?

  15. O que você não poderia viver sem?

Os ídolos deixam a realidade obscura, consomem recursos e roubam a alegria

Em algum momento da vida, seu arsenal de preferências vai estar entupido de imagens endeusadas. São coletâneas de ideias, pessoas, comportamentos que já passam de meros gostos, mas se tornam fetiches irremediáveis.

É nesse ponto que nos tornamos como aquela criança mimada que tem o armário cheio de brinquedos legais e caros, mas que não só consegue brincar com nenhum mas também nunca se desfaz deles. Ou como aquele idoso teimoso que mantém o porão cheio de coisas inúteis, por apego bobo, mas que jura só guarda tudo aquilo porque um dia pode precisar.

Eu torço para que em algum dia, todos queiram limpar o seu palco de ídolos, trocar a trilha sonora das suas preferências e reajustar os focos dos holofotes da sua atenção. Não basta querer reciclar, mas tem coisa que precisamos jogar no lixo.

Responda rápido: Você consegue observar como as pessoas que te amam se sentem quando te veem sendo radical? Você é capaz de notar como essa compulsão se tornou um ídolo e está te prejudicando fisicamente, emocionalmente, socialmente e existencialmente? Que lugar esse elemento ocupa na sua vida?

Acredite em mim, o dia em que tomar a decisão de queimar seus ídolos por puro esporte, remover os confortos mais radicais e repaginar a decoração do olhar sobre tudo, você vai começar a ver que a sua apuração da existência está bem mais concreta com o real.

Tome coragem e decida terminar com essa festa. Até que você não tenha entendido o prejuízo de alimentar ídolos, você não poderá viver. Eu te convido a fazer um esforço para tirar férias desse ídolo por algum tempo e esperar para ver o que acontecerá.

Faça uma pausa com seus ídolos. Mate um a um até que se livre do orgulho, da luxúria e das mentiras que comprou. Ponha à prova tudo que sabe. Deixe seu coração e alma agitados, abalados e receptíveis. Dê lugar para o que está adiante.

Qualquer coisa que colocar antes da serenidade, que desejar sem pensar, que não consegue abandonar, que dá sua dedicação total é um ídolo. Desistir de um ídolo é muito parecido com terminar um caso de amor, por isso é difícil. É uma verdadeira tristeza, mas assim que superarmos a dor, podemos começar a crescer.

Quando você não tem ídolos, pode cantar mais canções. Quando você não tem ídolos, pode fazer mais coisas. Quando você não tem ídolos, pode agir mais diferente. Quando você não tem ídolos, pode descobrir mais possibilidades.

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